O CARF tem jurisprudência majoritária no sentido que um planejamento tributário, com o único propósito de reduzir a carga tributária, implica em abuso, mais especificamente, elisão abusiva.
De acordo com esse entendimento, para que um planejamento tributário seja oponível ao fisco, não basta que o contribuinte, no exercício do direito de auto-organização, pratique atos ou negócios jurídicos antes dos fatos geradores e de acordo com as formalidades previstas na legislação societária e comercial. É necessário que haja um propósito negocial, de modo que o exercício do direito seja regular.
Nosso colega, o advogado tributarista Marco Aurélio Poffo, do BPH Advogados (Blumenau/SC), também concorda que o Fisco defende com frequência que a economia tributária, por si só, não é justificativa suficiente para fundamentar o planejamento tributário. Na visão do Fisco, haveria a necessidade de o contribuinte comprovar a existência de outra finalidade que não seja apenas a redução da carga tributária. Com base nisso, não são raras as autuações fundamentadas na suposta ausência de propósito negocial, de acordo com Poffo.
Contudo, recentemente, um julgado do CARF decidiu em sentido diametralmente oposto. Trata-se do Processo 16327.721148/2015¬23, Acórdão nº 1401¬002.835 – 4ª Câmara / 1ª Turma Ordinária.
Segundo o relator muito embora o fisco entenda que a presença de um propósito negocial deve ser precedente e, além, originária na operação, de modo a concretizar a o negócio jurídico e a redução da carga tributária como uma conseqüência natural e lógica, em verdade, o conceito de propósito negocial não consta na legislação, o que o torna subjetivo e abrangente.
O relator do processo, o Conselheiro Daniel Ribeiro Silva, destacou que:
“…a indefinição dos conceitos no ordenamento jurídico impede a formação de entendimento uniforme, tornando qualquer discussão acerca da motivação para operações societárias como ao menos parcialmente subjetivas, afastandose do princípio da tipicidade cerrada que foi base de formação do direito tributário.
É freqüente utilização pelo Fisco da teoria da ausência de propósito negocial por meio do qual defende que a simples inexistência sob sua ótica outros motivadores para a operação que não o alcance do benefício fiscal, tem sido usada como elemento suficiente para invalidar os atos do contribuinte ou o benefício fiscal almejado.
Tal lógica ao meu ver se afasta da necessária objetividade da lei tributária, fundada no princípio da tipicidade cerrada, além de afetar a segurança jurídica vez que diversas regras e estruturas criadas pelo legislador brasileiro oferecem um benefício fiscal aos contribuintes como parte integrante de uma política econômica”.
Desta forma conclui que a economia tributária e a busca por uma carga tributária menor por si só já se constitui em propósito negocial.
Note-se que nesse julgado o CARF entendeu também que o contribuinte teria demonstrado a existência de outra finalidade para as operações realizadas além da economia tributária, mas, mesmo assim, o principal entendimento que prevaleceu no julgado é de que “não tem amparo no sistema jurídico a tese de que negócios motivados por economia fiscal não teriam ‘conteúdo econômico’ ou ‘propósito negocial’ (…)”.
Segue ementa do julgado:
“PRELIMINARES. SUPERAÇÃO EM RAZÃO DE APRECIAÇÃO DE MÉRITO.
Nos termos do que dispõe o §3o. do art. 12 do RPAF, sendo possível o provimento no mérito, devem ser superadas preliminares de nulidade.
PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO. MOTIVO DO NEGÓCIO. CONTEÚDO ECONÔMICO. PROPÓSITO NEGOCIAL. LICITUDE.
Não existe regra federal ou nacional que considere negócio jurídico inexistente ou sem efeito se o motivo de sua prática foi apenas economia tributária. Não tem amparo no sistema jurídico a tese de que negócios motivados por economia fiscal não teriam “conteúdo econômico” ou “propósito negocial” e poderiam ser desconsiderados pela fiscalização. O lançamento deve ser feito nos termos da lei.
SUBSIDIARIAMENTE. EXISTÊNCIA DE EFETIVA RAZÃO EXTRA TRIBUTÁRIA. COMPROVAÇÃO.
No caso concreto as Recorrentes comprovaram existir razões de ordem negocial e restrições impostas pela Resolução CMN 2.325/1996 que justificam as operações realizadas” (Processo 16327.721148/2015¬23, Acórdão nº 1401¬002.835 – 4ª Câmara / 1ª Turma Ordinária. Publicado em 10.09.2018).